segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Rádio Paradiso - os beijos censurados e os amores roubados por Walter Silva



Uma nova experiência aqui no blog. Por favor, comente se gostou ou não e o que julgaria que poderia melhorar futuras apresentações de conteúdos nesses moldes. Você vai assistir a um vídeo com o conteúdo que preparei para o 11º Encontro Internacional de Música e Mídia - Uma vereda tropical: Aproximações, percursos e disjunções na cultura brasileira... e suas latinidades conexas.



... atrás de “Risque”, e outros cometimentos, vieram milhares de “samboleros”, que acabaram por fazer com que uma juventude mais bem informada achasse nos caminhos do próprio samba a solução momentânea para o problema: a bossa nova .
Walter Silva

Giuseppe Tornatore emocionou o mundo ao dirigir e escrever Nuovo Cinema Paradiso, lançado em 1988. O filme faz uma declaração de amor ao cinema e tem cenas de flashback em um tempo em que a TV ainda não era dominante, mas já era sentida pelo cinema como uma concorrente. No Brasil, chamada simplesmente de Cinema Paradiso, a película chega às telonas no início de 1990. Nessa comédia dramática, um cineasta de sucesso vive em Roma, mas volta à cidade natal após a morte do projecionista Alfredo, com quem aprendera a amar a sétima arte. No retorno a Giancaldo e, consequentemente, à sua infância, acompanhamos o trajeto do menino Totó até que se tornasse o cineasta Salvatore Di Vita. Quando criança, ele era coroinha da igreja e, após a missa, refugiava-se no Cinema Paradiso para fazer companhia a Alfredo e espiar as cenas de beijos que eram censuradas pelo padre. Foram esses beijos que fizeram o menino amar os filmes. Na volta a Roma, recebe o presente que o projecionista tinha deixado a ele, uma edição com todas as imagens de beijo que haviam sido censuradas. 

Walter Silva, assim como o padre do filme, aproveitou a enorme repercussão que alcançou no rádio para “censurar” aquilo que considerava “música de fossa” e apoiar uma nova bossa para a música brasileira. Mesmo diante da ascensão da televisão no Brasil, ao optar pela execução das músicas em LPs, o disc-jockey teve o programa de variedades de maior audiência do rádio no Brasil. No final dos anos 1950, de acordo com o IBOPE, a atração comandada por ele era ouvida por um milhão e setecentos mil ouvintes por dia. Era o Pick-up do Picapau, que sucedia o Toca do Disco, levado ao ar pelo comunicador um ano antes na Record, que estreava em 1958, na Rádio Bandeirantes. A emissora vivia seu momento mais auspicioso. Às vésperas da Copa do Mundo daquele ano, o diretor Comercial e Artístico Edson Leite criara a Cadeia Verde Amarela, com cerca de 400 retransmissoras da programação.

Na Bandeirantes, Walter Silva encontra o cenário ideal para suas propostas. A emissora, já em 1955, aposta no rádio musical como alternativa à chegada da televisão. Em depoimento ao acervo Multimeios, do Centro Cultural São Paulo, Silva declara em 1983: “Os programas de disco tinham liberdade para se estender. Não era apenas ‘vamos ouvir’ e ‘acabamos de ouvir’. Havia críticas, comentários, ligações telefônicas, reportagens. Era um rádio vivo, atraente, que prendia o ouvinte. Feito por gente inteligente. Sem apelações. Na época, a relação com as gravadoras era saudável, amistosa. Elas não se atreviam a impor algo. Os DJ’s tinham liberdade para elogiar ou criticar os discos perante os divulgadores”.

Walter Silva usou a força de seus programas e a habilidade como produtor musical para incentivar a Bossa Nova em oposição às músicas de artistas que ainda figuravam com destaque nas paradas de sucesso com seus boleros, rumbas e mambos, além do samba-canção, que se apropriava também de temas que embalavam a “dor de cotovelo”.

Silva considerava ultrapassadas e de mau gosto as interpretações de artistas como Nelson Gonçalves e Adelino Moreira. Este texto objetiva fazer uma espécie de paralelo entre os beijos censurados pelo padre em Cinema Paradiso e amores roubados por Walter Silva. 

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Radiofobia, de Leo Lopes, entrevista o radialista Marcelo Abud


Minha vida em sintonia com o rádio. Estou no Radiofobia, do bom amigo do rádio Leo Lopes:...
Posted by Peças Raras on Terça, 22 de setembro de 2015

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Dia do Radialista: O rádio na Era Vargas, por Lira Neto

Getúlio proclama o Estado Novo em cadeia nacional de rádio (novembro de 1937)
Entrevistei o jornalista Lira Neto, biógrafo de Getúlio Vargas, para o NET Educação (a entrevista completa está neste link). Aqui um trecho extra da conversa, em que o escritor fala sobre o uso do rádio na Era Vargas. 

(Se o player não estiver visível, clique aqui)

Aproveitamos para lembrar que o Dia do Radialista, que atualmente é comemorado em duas datas (21 de setembro e 07 de novembro - aniversário de Ari Barroso), teve origem em 1943, quando o então presidente sancionou uma lei para fixar o piso salarial da categoria. 

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

65 anos de TV no Brasil: relembre as cenas dos primeiros capítulos, por Lima Duarte

Imagens de Lima Duarte extraídas do blog Respeite o Idoso




Com tanta experiência e tendo atingido um patamar imconparável na TV, o artista foi o responsável pelo prefácio do livro "A Hollywood Brasileira – Panorama da telenovela no Brasil", de Mauro Alencar. Acompanhe o delicioso texto que conta como nasceu a televisão no Brasil e quem foram seus pioneiros. Lembrando que a TV completa 65 anos agora em 2015, neste dia 18 de setembro.



AMIGOS, TARDES E PETECAS
(Lima Duarte)

A gente chegou para jogar peteca – Hebe Camargo, Lolita Rodrigues, Walter Forster, Heitor Andrade, Dionísio Azevedo, Ribeiro Filho, Osni Silva e eu. Todos grandes amigos.

Era de tardezinha e isso aconteceu num tempo em que ainda existiam amigos, tardes e petecas... Um sujeito lá virou para nós e disse: “Não! Não podem mais jogar aqui!” O Osni Silva, que era o mais destemperado, perguntou: “Não pode por quê?” E o homem respondeu: “Porque nós vamos limpar este terreno e amanhã começamos a furar tudo para fazer a televisão.”

Era 1948 e eu trabalhava lá desde 1946. Tudo comprovado e atestado em minha carteira profissional. Eu tinha 16 anos e chegara de Minas Gerais, mais precisamente de Desemboque, em 1946, de maneira que a televisão veio estragar o nosso campo de peteca. Furaram, arrebentaram tudo e construíram a primeira emissora de televisão da América Latina, a TV Tupi Difusora de São Paulo. A segunda foi a TV Cubana, inaugurada no mesmo ano, mas no mês de novembro. A Tupi era de setembro, 18 de setembro mais precisamente. O Walter Forster morreu sustentando que a primeira fora a Cubana e que Havana naquela época era o bordel dos americanos; então, nada mais natural do que a existência de uma TV num bordel. Eu estive em Havana, não a do Fulgêncio (o bordel), mas a do Fidel, um povo íntegro, digno e corajoso, e comprovei que a televisão brasileira é dois meses mais velha.

Tudo isso porque eu considero importante que saibam do contexto em que tudo aconteceu. O contexto era este: amigos, tardes, petecas, e é bom que saibam que eu estive lá desde o começo, ou antes do começo.

Quando a televisão ficou pronta, instalou-se um problema: quem seria o primeiro diretor artístico da América Latina? Existiam três candidatos (eu gosto muito de pensar que televisão seria essa, se um dos outros dois tivesse sido o escolhido): Walter George Durst, Túlio de Lemos e Cassiano Gabus Mendes. Venceu o último, que, uma vez escolhido para ser o diretor, disse: “Eu exijo que o meu assistente seja o Lima Duarte.” Eu gritei: “Opa! Que é isso, está querendo me estrepar? Vou deixar de ser o melhor sonoplasta da Rádio Tupi Difusora para ser diretor de televisão? De jeito nenhum.” Foi então que ele escolheu o Luiz Gallon e, como assistente do Gallon, o Luiz Gustavo, seu cunhado.

É realmente verdadeira aquela história que contam até hoje de que no dia 18 de setembro, depois da inauguração, houve um jantar. Já na sobremesa e antes do cafezinho, o Cassiano perguntou: “Ih... e amanhã o que é que a gente põe no ar?!” Saímos correndo aos consulados para ver quem tinha algum filme para ser exibido na televisão e achamos uma porção: filmes sobre história natural, biologia, Cubismo, os perigos da doença venérea, os males que a sífilis traz e Marshall McLuhan; enfim, uma televisão muito louca.

Um ano depois desse happening, em 1951, o Cassiano teve a idéia de fazer uma telenovela, pois é bom que se diga que a televisão no Brasil foi implantada e sustentada por gente de rádio. Nem jornalistas, nem intelectuais, nem o pessoal do teatro, nem a comunidade universitária, ninguém tomou conhecimento e, nós, os do rádio-teatro, tocamos aquilo. Nada mais natural do que a adaptação de uma novela de rádio para a televisão. Foi quando aconteceu o tão falado fenômeno Sua Vida me Pertence, de Walter Forster, interpretada pelo Walter e pela Vida Alves.

Nessa telenovela apareceu não só o primeiro beijo, mas também o primeiro bandido, o primeiro delegado, o primeiro médico, o primeiro pai, a primeira mãe, o primeiro amor, o primeiro desengano, a primeira esperança, a primeira lágrima, a primeira insídia e o primeiro final feliz, com o tal beijo; enfim, tudo o que existe nas novelas até hoje. O engraçado nesse primeiro beijo é que a autoridade de plantão o proibiu, argumentando: “Não. As televisões entram nos lares e esses lábios unindo-se em lascívia, penetrando o recôndito do lar brasileiro, vão ofender a moral da família.” Bem, era um tempo em que ainda existiam famílias, lábios e lascívia. Os autores disseram: “Não. O beijo é necessário”, e os atores disseram que também queriam beijar. O general insistiu: “Não.” O juiz também disse: “Não.” O bispo fez eco: “Não, não e não. Ainda se fossem americanos, mas são brasileiros beijando-se com bocas brasileiras, isso nunca.” No dia do último capítulo que iria ao ar à oito horas da noite, houve uma reunião na sede da censura para a decisão do beija ou não beija. Só às seis horas saiu o veredicto. “Beija, mas de boca fechada.” Essa foi a melhor história da primeira telenovela ainda não diária. Eu estava lá e era o bandido.

O mais curioso, e que talvez mereça mesmo uma análise, foi a segunda telenovela. Um êxito enorme! Claro, só havia nós no ar e a novela era rural, já a segunda... Chamava-se Sangue na Terra, de Péricles Leal, ele também um intelectual, paraibano, filho de Simião Leal, jurista, ficcionista, um homem de letras. A novela passava-se na Serra de Borborema e contava a história de Antonio Silvino, o maior cabeça de jagunço que jamais houve, sob o comando de quem o iniciou no cangaço, Virgulino Ferreira, o Lampião.

Se for verdade que o Brasil passou da sociedade rural à sociedade urbana, ou se está passando em apenas cinqüenta anos, não menos verdade é que o brasileiro ficou com um pé na roça, e desse pé na roça surgiram novelas lindas! Entre as dez melhores eu destacaria umas sete de ambientação rural; a primeira em cores, O Bem Amado, na qual eu também estava, pois era o Zeca Diabo; a primeira da “nova República”, Roque Santeiro, em que eu estava também, fazendo Sinhozinho Malta.

Para concluir, a novela que marcou aquele período inicial foi mesmo O Direito de Nascer, também dirigida por mim. Uma novela rigorosamente genial. Como era novela de rádio cubana, transportada para televisão e para o Brasil, eram necessários muitos acontecimentos. Para falar dela, aproveito Umberto Eco em Viagem na Irrealidade Cotidiana:
“(...) é preciso colocar tudo e para colocar tudo é preciso escolher no repertório do já comprovado. Quando a seleção do já comprovado é limitada, tem-se a série maneirista, o seriadozinho e até mesmo o kitsch, mas, quando do já comprovado se coloca tudo, tem-se uma arquitetura como a da igreja Sagrada Família, de Gaudí. Fica-se com vertigem, esbarra-se na genialidade”.

Depois de O Direito de Nascer, uma pá de cal despencou sobre os barões, filhos naturais, sinhazinhas, babás remanescentes da escravidão, coronéis furibundos. Essa pá de cal chamou-se Beto Rockfeller, de autoria de Bráulio Pedroso, na época editor do suplemento de O Estado de São Paulo, que desenvolveu a novela baseado numa idéia de Cassiano Gabus Mendes para a interpretação de Luiz Gustavo e direção de Lima Duarte. Assim, só me restava mesmo ir para a TV Globo, emissora em que estreara o segundo grande executivo de televisão: José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, que contratou a equipe de Beto Rockfeller para fazer na Globo uma revolução, O Bofe, a mais anárquica de todas as telenovelas, escrita pelo mesmo Bráulio Pedroso. Mas revolução não se encomenda, acontece, e a novela acabou não obtendo o sucesso esperado. Eu ainda tinha um mês de contrato a cumprir e fui obrigado a fazer um papel episódico na primeira novela em cores, O Bem-Amado. Iria participar de cinco capítulos apenas, mas o Zeca Diabo não pôde sair – o público obrigou-os a mantê-lo até o fim da trama e matar Odorico Paraguaçu, que inaugurou o cemitério de Scucupira.

Bem, esse foi o começo das telenovelas. Agora se diz que os reality shows ocuparão, na afetividade popular, o lugar das telenovelas. Eu gosto da idéia de que essa nova maneira de contar histórias venha a substituir a antiga. Se for verdade que cada movimento considerado artístico empurra o anterior para o território da arte absoluta, assim como a dança empurrou a música, o teatro empurrou a dança, o cinema empurrou o teatro e o teleteatro empurrou o cinema, que bom se os reality shows nos empurrarem mesmo para o recôndito universo das grandes histórias que contam com grandeza, sabedoria, ternura e beleza a história de um povo e seu destino.

Escrito por Lima Duarte – Prefácio do livro
“A Hollywood Brasileira – Panorama da Telenovela no Brasil”, de Mauro Alencar.

sábado, 12 de setembro de 2015

Interferência traz peças raras nos 93 anos do rádio


(Se o player não estiver visível, clique aqui para ouvir

Acompanhe a minha "Interferência" deste sábado, dia 12 de setembro de 2015. Você vai viajar por momentos importantes da história do rádio:
Anos 1920 - Depoimento de Roquette-Pinto sobre a criação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro.
Anos 1930 - Ademar Casé e Nássara relembram como surgiu o primeiro jingle em 1932.
Anos 1940 - Abertura da primeira radionovela: Em Busca da Felicidade.
Anos 1950 - Ângela Maria Canta
Anos 1960 - Walter Silva (o Pica-Pau) chama Lolita Rodrigues para dividir a apresentação do aniversário de 2 anos do Pickup do Pica-Pau, na Rádio Bandeirantes. 
Anos 1970 - Hélio Ribeiro e sua tradicional tradução livre para o português.
Anos 1980 - Teste de locução feito para a estreia da Rádio Cidade de SP, em 1979.

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quinta-feira, 3 de setembro de 2015

O maior na antiga maior: Zé Bettio na Rádio Record em 1976



Fui convidado a falar um pouco sobre o Zé Bettio para o quadro Por Onde Anda, no Manhã Bandeirantes. Para elaborar minha participação nessa homenagem, utilizei um verdadeiro conteúdo colaborativo: o áudio que serviu de inspiração e lembrança é de um CD que ganhei do Celso Casemiro, do Memorial Hélio Ribeiro. A foto acima é uma das raras de Zé Bettio e foi tirada pelo amigo e videomaker Valdemar Jorge. Para o texto, utilizei como base a pesquisa conduzida pela produtora e professora de Comunicação Eliana Lobo, que estudou o programa que liderava as madrugadas para o Centro Cultural São Paulo. 


(Se o player não estiver visível, clique aqui para ouvir)

Nos anos 1970 e 1980 muita gente acordava com o animado Zé Bettio. Além das longas conversas e músicas sertanejas, eram marcantes os sons que utilizava, como o de um balde d’água. Na mesa da rádio, Zé Bettio utilizava vários apetrechos para gerar os sons, entre eles: um sino grande de gado e um despertador. Já os personagens do programa eram lançados em dois gravadores que continham áudios gravados na própria fazenda do apresentador. No início, no meio e no final do programa, os ouvintes eram saudados pelas vaquinhas Mascarada, Chita e Fortuna. Também estavam sempre presentes o bezerro Maru, o burrinho Teimoso, a galinha Sabina e o galo Lero-Lero.
A principal marca que Zé Bettio imprimiu ao rádio é o diálogo. O improviso e o tom intimista faziam parte das conversas mantidas pelo comunicador com empregadas domésticas, motoristas de caminhão e de táxi, lavradores e pedreiros.

Zé Bettio falava como poucos ao homem do campo e àqueles que chegaram à cidade grande, mas têm saudade da vida simples do interior. O bate-papo também era direto quando anunciava algum remédio. O comunicador fazia o ouvinte acreditar que ele estava preocupado com sua saúde e não em fazer uma mera propaganda.

Uma extensa pesquisa realizada pela Professora de Comunicação Eliana Andrade em 1980 para o IDART – Departamento de Informação e Documentação Artísticas – apontou como principais características de Zé Bettio a simplicidade, a naturalidade e a sinceridade. O bom humor e estilo caipira aumentam ainda mais a popularidade do apresentador.


Zé Bettio não gosta de ser fotografado e até hoje concedeu poucas entrevistas sobre sua vida particular. Sempre acreditou que a força do rádio estava justamente no imaginário do público, que pode pensar nele como quiser. Mas aos sábados e domingos, durante muito tempo, o ouvinte podia conhece-lo nos famosos bailões que promovia.